Pesquisador fala em produtividade sem desmatar

Pesquisador fala em produtividade sem desmatar

11 de julho de 2017 0 Por meums
Spread the love

O professor Clandio Ruviaro é bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq e atualmente coordenador da Pós-graduação em Agronegócios da UFGD. Ele foi um dos autores do artigo Pegada de carbono em diferentes sistemas de produção de carne: um estudo de caso, publicado em 2015 no renomado Journal of Cleaner Production. Este trabalho está na primeira posição em número de citações na base de dados Scopus – o maior banco de dados de artigos e citações de literatura. Nos último dois anos, nenhum outro texto da mesma área e linha de pesquisa obteve mais destaque.

Os autores utilizaram a metodologia de Avaliação do Ciclo de Vida para analisar o grau de sustentabilidade ambiental da produção de carne no Brasil em diversos sistemas diferentes. Nesta metodologia são consideradas as atividades resultantes em emissão de dióxido de carbono (CO2) desde o fornecimento de insumos para produção animal até a entrega da carne bovina nos principais portos de destino.

Como surgiu este artigo?

Este artigo foi publicado em 2015 no periódico internacional Journal of Cleaner Production, que é um dos principais periódicos da área para quem trabalha com a metodologia da Avaliação do Ciclo de Vida. O trabalho foi originado a partir da minha participação em um congresso na Itália em 2010, quando eu já tinha interesse em saber sobre a sustentabilidade da pecuária brasileira em termos de questões ambientais. Lá essa questão foi muito levantada por pesquisadores e não havia nenhum trabalho a respeito que apresentasse números relacionados à sustentabilidade da pecuária brasileira. Nessa época eu fazia meu doutorado e me interessei em pesquisar essa questão.

Como funciona a metodologia da avaliação do ciclo de vida?

É uma metodologia normatizada pela ISO 14040 e 14044, onde se avaliam os impactos ambientais, econômicos e sociais de produtos em qualquer processo produtivo. A metodologia é bem abrangente, em português a chamamos de “do berço ao túmulo”. A gente estuda toda a cadeia produtiva, desde a extração dos minerais que serão utilizados na confecção dos fertilizantes que serão usados para adubar a terra das pastagens que os animais vão comer até o transporte da carne pronta para os frigoríficos.

No caso específico do meu artigo, eu analisei o potencial de aquecimento global, ou seja, qual é o impacto que existe na produção pecuária na região Sul, no bioma pampa. Avaliei sete tipos sistemas de manejo ou sistemas alimentares da pecuária de corte, qual deles teria maior e menor impacto ambiental, o que se pode fazer para diminuir os impactos, e quantifiquei qual o impacto: quantos quilos de CO2 (dióxido de carbono) equivalentes são produzidos para cada quilo de carne.

Quais os principais ítens encontrados na pesquisa que contribuem negativamente para a sustentabilidade ambiental?

Para a pecuária de corte, o importante é a qualidade do alimento do animal. Aqueles alimentos com maior digestabilidade, eles emitem menos gás estufa. Alimentos piores ou mais fibrosos fazem o animal emitir mais gases de efeito estufa. O manejo dos animais na área de produção também é fator importante.

Do ponto de vista ambiental, qual o melhor sistema para a criação de gado?

Na comparação entre os diversos sistemas de produção no Rio Grande do Sul, o sistema de campo nativo suplementado com um alimento proteico energético, em menor quantidade, se mostrou o mais sustentável ambientalmente. O resultado então é que é sustentável produzir em sistemas naturais desde que feita uma suplementação com os animais. Essa fórmula pode gerar uma boa produção de carne com pouca emissão de gases de efeito estufa.

E isso é interessante por que a gente pega trabalhos internacionais que sempre falam muito que as emissões da pecuária brasileira variam na faixa de 20 a 25 quilos de CO2 equivalente por quilo de carne – e isso não é verdade. Os nossos resultados mostram que, fazendo alguns cálculos, eles vão variar de 9 a 13 quilos de CO2 equivalente por quilo de carne. E isso falando apenas em termos de emissões, por que esses trabalhos são muito recentes, começaram de 2009 pra cá, tanto nas universidades como por parte da Embrapa. Então os resultados estão vindo à tona agora.

E o que estamos fazendo agora?

Como já temos dados de sequestro de carbono em áreas bem manejadas, esse pasto também capta carbono da atmosfera. A gente chama isso de sequestrar carbono. Então quando eu tenho esse equilíbrio entre o que eu sequestro de carbono e o que o animal emite, o nosso balanço é extremamente positivo, porque fica mais baixo ainda – deverá ficar em torno de 3 a 4 quilos de CO2 equivalentes por quilo de carne. Isso tudo é interessante para a indústria aplicar e utilizar depois como marketing. Nós hoje temos condições de aumentar a produtividade sem desmatar nada mais, basta a gente mudar o manejo, ajustar cargas… dá pra fazer muita coisa sem cortar uma árvore.

Mas isso já vem sendo feito no Brasil ou ainda é a exceção?

Nós já temos muita tecnologia disponível para o produtor, tanto aqui no Centro Oeste quanto no Sul do Brasil. Só que às vezes é um pouco difícil levar isso para um produtor que queira e implemente, porque tem que quebrar com uma barreira cultural, com a tradição. A resistência a adotar novas tecnologias sempre é grande. Então é preciso começar com alguns fazendeiros, depois outros vão observando e se familiarizando… Isso é uma coisa que leva tempo.

Esse sistema que funciona melhor do ponto de vista ambiental também tem relação com a qualidade da carne?

Indiretamente tem uma relação, no seguinte sentido: animais com melhor qualidade genética são animais que têm melhor conversão alimentar, aproveitam melhor aquilo que estão comendo. E ter melhor conversão faz ter também uma melhor emissão. Não que você vá melhorar a qualidade da carne nesse sentido, mas vai ter uma melhor eficiência de transmissão de processo. Agora, melhorar a qualidade da carne, diretamente, não. Isso depende mais da raça dos animais. O que pode acontecer é que, se eu otimizar meu processo, eu encurto o tempo que eu preciso para esse animal ficar gordo e pronto pro abate.

Então nesse caso o ganho maior é mesmo na produtividade?

Ganha mais na produtividade, ao encurtar o ciclo de vida do animal para ele poder se aprontar. O que nós vimos é que o modelo de produção mais ambientalmente sustentável é também o mais economicamente sustentável. Pela metodologia da avaliação do ciclo de vida, é possível identificar onde está o gargalo que você precisa atuar pra melhorar seu processo. E melhorando seu processo, melhora a rentabilidade do negócio. Então você ganha pelos dois lados: ambientalmente e economicamente.

Dourados Agora


Spread the love