Amamentação combate a desnutrição e a mortalidade
28 de julho de 2017É completo, seguro e altamente nutritivo e, de acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a sua oferta exclusiva protege bebês contra doenças perigosas, além de ajudar na criação de um forte laço entre mãe e filho. E não se trata de uma fórmula mágica ou um medicamento caríssimo, pois esses e outros benefícios são proporcionados pelo leite materno.
Atualmente, muito se fala em aleitamento materno, que acabou se tornando uma das principais bandeiras da saúde pública mundial. A prática da amamentação, fortemente incentivada pela Unicef e difundida por órgãos de saúde de centenas de países, é responsável pela queda da mortalidade em crianças com até cinco anos no Brasil.
Como parte das políticas pró-aleitamento, há 20 anos os primeiros sete dias do mês de agosto são voltados a ações globais em prol da amamentação, durante a Semana Mundial de Aleitamento Materno (SMAM). Mais recentemente, ainda, se estabeleceu que todo o mês de agosto passa a ser símbolo da luta pelo incentivo à amamentação, tendo se criado assim, o Agosto Dourado.
Em referência ao período, esta edição da Entrevista do Mês traz uma conversa com a fisioterapeuta Amanda Jorge de Souza Stefanello, que é tutora da Estratégia Amamenta e Alimenta Brasil, do Ministério da Saúde, e atua na Maternidade do Hospital Universitário da Universidade Federal da Grande Dourados (HU-UFGD) há três anos.
Especialista em Saúde Pública e presidente da Comissão de Incentivo e Apoio ao Aleitamento Materno do HU, a profissional trabalha no auxílio a apoio à amamentação no pós-parto imediato e na intercorrência de gestações de alto risco. Além disso, Amanda vive em seu dia a dia uma experiência única com o aleitamento: há um ano e meio tornou-se mãe do pequeno Théo.
“Théo é meu primeiro filho, um menininho de cabelos dourados, sorriso largo e muita energia, fruto de uma gravidez muito desejada e tranquila. Veio para fortalecer ainda mais minhas convicções acerca do aleitamento materno: mamou exclusivamente o seio materno por seis meses, sem uso de bicos artificiais, e eu também pude contribuir com muita alegria com o Banco de Leite Humano, por seis meses, como doadora”, relata a fisioterapeuta.
Hoje, com um ano e cinco meses, Théo continua “firme e forte no leite materno” e, segundo Amanda, quem vai decidir o momento de parar é ele mesmo. “Amamentar hoje é pensar no futuro”, afirma.
Confira a entrevista completa, realizada pela Unidade de Comunicação Social do HU-UFGD:
Ainda hoje, muitos mitos giram em torno do tema amamentação. Crenças, muitas vezes, repassadas por mães e avós, que infelizmente não tiveram a orientação adequada sobre o assunto, deixam algumas mulheres inseguras e podem atrapalhar esse momento tão importante. Nos últimos anos, porém, esse cenário tem mudado, para melhor, pois gestantes e lactantes têm recebido todas as informações necessárias, vindas de campanhas, estudos, cartilhas e, principalmente, de profissionais de saúde especializados no assunto. Por que você acha que o aleitamento materno se tornou essa grande bandeira da saúde pública?
Amanda – Até a década de 1970, a legislação brasileira era ineficaz no controle do marketing de alimentos para lactente, do mesmo modo que o uso de chupetas e mamadeiras era livre e crescente. Assim como em outros países, o Brasil apresentou um declínio nas taxas de aleitamento materno e observou-se o aumento da desnutrição e da mortalidade infantil, cujas taxas chegaram a 88 em cada mil nascidos vivos. A partir dessa constatação, várias ações de incentivo ao aleitamento materno recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) foram estabelecidas pelo governo brasileiro, visando o aumento das taxas de amamentação e a redução da mortalidade infantil. Diversas pesquisas são realizadas constantemente, confirmando a superioridade do leite materno na alimentação do bebê e a concepção da amamentação como um direito da mãe e da criança. Sendo assim, a promoção do aleitamento materno exclusivo é de extrema importância por ser a intervenção isolada em saúde pública com o maior potencial para a diminuição da mortalidade na infância, sendo de baixo custo e efetiva, com inúmeros benefícios para mãe, para o bebê, para a família e para a sociedade.
Muito se fala que o leite materno é um alimento completo e que não se deve dar outro tipo de nutrição ao bebê, até os seis meses de idade. Que benefícios esse alimento oferece à criança? É mito ou verdade que algumas mulheres têm “leite fraco”?
Amanda – O leite materno possui nutrientes e substâncias de proteção ao organismo como nenhum outro e é considerado padrão ouro para o crescimento e o desenvolvimento do bebê. Os benefícios do leite materno são inúmeros, dentre eles destacam-se: redução da mortalidade infantil; redução da morbidade por diarreia; redução da morbidade por infecção respiratória; redução de alergias; melhor desenvolvimento da cavidade bucal; redução de doenças crônicas não transmissíveis na vida adulta (como diabetes tipo 2, hipercolesterolemia e hipertensão arterial); melhor desenvolvimento intelectual e relacionamento interpessoal, além de favorecer o vínculo entre mãe e filho. O mito do leite fraco atravessa gerações, sendo uma das principais causas da complementação precoce alegada pelas mães. A comparação entre a aparência do leite materno, principalmente do colostro, em relação ao leite de vaca, faz com que a mãe considere seu leite inferior, acreditando que não serve para suprir as demandas do bebê. O leite de cada mamífero é espécie-específico, ou seja, é produzido sobretudo para suprir às necessidades de cada espécie. O leite materno possui todas as substâncias em quantidade e qualidade que os bebês necessitam. Um bebê amamentado exclusivamente mama com maior frequência exatamente pela fácil e rápida digestão e pelo aproveitamento total das substâncias contidas no leite materno. Há casos em que o bebê está perdendo ou mantendo o peso, mas isso também não é sinal de “leite fraco”: o bebê pode estar com dificuldades de mamar corretamente, com alguma infecção ou algum outro problema de saúde que deve ser observado e acompanhado.
Estudos comprovam que amamentar ajuda a mulher a voltar ao peso e a recuperar o corpo após a gestação, porque a produção de leite promove a queima de uma grande quantidade de calorias. Além dessa, quais outras vantagens o aleitamento pode proporcionar à mulher?
Amanda – Para a mãe, a amamentação apresenta resultados positivos para a saúde física. Favorece a recuperação do útero, diminuindo o risco de hemorragia e anemia após o parto. Minimiza o risco de desenvolver, no futuro, câncer de mama e de ovário, doenças cardiovasculares e diabetes, além de contribuir na prevenção de artrite reumatoide e de fraturas por osteoporose. O aleitamento materno exclusivo (até o 6º mês de vida) tem efeito sobre a amenorreia (ausência da menstruação) pós-parto, prolongando sua duração.
Dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, dão conta de que, no Brasil, em 2008, 75% das crianças receberam aleitamento exclusivo e em 2015, a porcentagem aumentou para 91%. Qual é o papel do profissional de saúde nesse estímulo à amamentação?
Amanda – O ato de amamentar demanda aprendizado contínuo entre mãe e bebê nos primeiros dias após o parto e o apoio e o incentivo dos profissionais que assistem ao binômio, além da compreensão da família, que é primordial para a efetividade da amamentação. O sucesso da amamentação está diretamente ligado às orientações adequadas oferecidas pelos profissionais à mulher durante o pré-natal, ao estímulo precoce, garantindo que o bebê seja colocado para mamar já na primeira hora de vida, e ao acompanhamento durante o puerpério e a puericultura. Cabe aos profissionais auxiliarem no manejo adequado da amamentação, prevenindo complicações na mama e cooperando para o combate aos mitos e informações errôneas, que muitas vezes contribuem para desencorajar a amamentação.
– O ato de amamentar, com certeza, é uma experiência única e que difere de mãe para mãe. No entanto, que dicas básicas as lactantes podem adotar para que o aleitamento seja feito de forma correta, oferecendo melhor cuidado ao bebê e evitando problemas comuns às mulheres nessa fase?
Amanda – Para que a amamentação ocorra de forma efetiva, garantindo bem estar à mãe e ao bebê, prevenindo complicações na mama e consequentemente evitando inferências na nutrição adequada do bebê, a mãe que amamenta deve realizar os seguintes cuidados: antes de oferecer o seio materno ao bebê, observar se a aréola está “macia” para facilitar a pega correta e a retirada eficiente do leite. Se a mama estiver muito cheia, realizar uma breve massagem e a ordenha manual para aliviar a aréola; se possível, para amamentar, a mulher deve estar sentada ou deitada em uma posição confortável, para evitar dores musculares decorrentes de posturas inadequadas; observar se o posicionamento e a pega ao seio materno estão corretos, lembrando que amamentação não deve provocar dor, nem lesões na mama. Em caso de fissuras, é recomendado corrigir a pega e passar o próprio leite materno nos mamilos e deixar secar. O leite materno é rico em substâncias cicatrizantes e anticorpos e protege os mamilos; amamentar sob livre demanda, ou seja, sem restrições de horários, sempre que o bebê solicitar e durante o tempo que ele necessitar, para que o mesmo esvazie toda a mama; só então, deverá ser oferecida a outra mama. Horários rígidos e a restrição da duração podem causar problemas relacionados ao ganho de peso ou ao bebê apresentar choro constantemente; evitar o uso de bicos artificiais como chupetas, mamadeiras e bicos de silicone, pois interferem na sucção adequada do bebê e podem favorecer a confusão de bicos, fazendo com que o bebê “rejeite” o seio materno. Vale lembrar que durante a gestação não é necessário utilizar buchas, cremes ou realizar qualquer tipo de exercício nos mamilos. O próprio organismo da mulher se encarrega de preparar a mama para amamentação. As informações adequadas e o empoderamento materno são o segredo para o sucesso da amamentação.