Crianças grandes
3 de janeiro de 2018Por Jackeline de Lara*
Perambulam pelas noites, cavam canais, forças, sonhos e, por vezes, vivem no submundo do pesadelo. De dia lavam, passam, cozinham, acalentam o filhinho nos braços e fazem o laço mais lindo nos cabelos longos e bem cuidado da filha.
Fazem compras no supermercado, sonhando com o futuro de seus filhos, nem sempre a saia é mini, algumas se passam por damas nas calçadas quando o sol brilha e a noite em suas minissaias de paetês, viram as estrelas de muitos e muitas.
Vadias, vagabundas, destruidoras de lares, de vidas, de homens, putas, prostitutas, escória da sociedade, vacasssss, são seus nomes mais comuns, enojadamente comuns, registrados de geração em geração, nada mais nada menos, pelos frequentadores assíduos de seus pontos, bordeis, e também pelas esposas e namoradas chifrudas que não suportam a ideia de serem trocadas por essas mulheres, que embora pareçam estar em desvantagem, é nos braços delas que seus homens querem estar, mesmo correndo riscos diversos e gastando dinheiro para isso.
Quem trabalha com crianças e teve alunos que são filhos de profissionais do sexo, sabem que normalmente, são mães amorosas, zelosas, que nada deixam a desejar em relação à mães maravilhosamente que se dedicam 24 horas apenas para suas famílias, portanto, é necessário uma mudança radical no trato com essas mulheres, que como toda mulher, são maravilhosas, guerreiras, e sonham com um grande amor, um verdadeiro lar.
Conheci, conheço algumas, e tenho observado o trato com os filhos, e isso me faz refletir sobre a forma como nossa sociedade trata essas mulheres e, cresce ainda mais em mim, a importância de leis que protejam mulheres e crianças em nosso país, e o nojo por esses homens que pagam para estarem com elas, porque incentivam algo que as tornam objetos, e com conhecimento de causa, nenhuma quer essa vida, e todas buscam dias melhores, longe de tudo isso.
Elas merecem e precisam do respeito de todos, vivem como que em uma teia de aranha espiritual e emocional, da qual são escravas e cegas, e ali sobrevivem a cada dia sendo exploradas, desonradas, menosprezadas, escravizadas, e estupradas, sim estupradas, por esses porcos que acreditam serem homens, e muitas vezes lideram escalões importantes na sociedade, e até igrejas. É preciso mudança de mentalidade, elas são vítimas, e não vilãs, quem vai lá, vai porque quer, e quer tanto que paga, e deveriam serem presos esses tarados.
Não sabem, não têm noção do que fazem, suas mentes foram formatadas desde a infância para isso, e elas realmente acreditam serem as vilãs, que nem de longe são na verdade.
Realmente não sei o que se pode ser feito de imediato, só sei que são nossas irmãs, crianças grandes, que já sofrerão horrores inimagináveis, viram coisas que nenhuma mulher deveria ter visto, e isso rasga a alma, quando tentamos parar e refletir sobre, então imagino, como está a alma delas que passam na prática por aquilo que não conseguimos imaginar sem sentir nojo de nós mesmos, e uma profunda dor misturada ao sentimento de impotência.
Iniciemos por saber que não somos melhores, não andamos suas estradas, não conhecemos seus contextos, apenas tivemos sorte. Se houver em nós, podre como somos, um pouquinho de dignidade, podemos começar com um olhar de afeição, um aperto de mão, e até um abraço apertado, demonstrando que se um dia precisarem, estaremos ali, mesmo que para ouvi-las, e mais importante que isso, eduquemos nossos filhos para fazerem o mesmo, e jamais se aproveitarem delas, pois poderiam serem suas mãe, irmãs.
* Jackeline de Lara, graduada em Pedagogia, especialista em Educação Especial e em Educacão Infantil e Séries Iniciais, proprietária do Espaço Kids. Casada e mãe de duas lindas meninas.